Com 108 anos de idade, o Clube do Remo é o segundo clube mais antigo do futebol paraense, atrás apenas da Tuna. Surgido como um clube para disputa de competições de regata, esporte de elite à época, a agremiação rapidamente desenvolveria um forte lado social. Em sua própria sede náutica, criaria um espaço para festas e reuniões e cresceria socialmente.
Nessa longa jornada, de lá para cá, o Leão Azul amealhou para si grandes conquistas no seu quadro social e de patrimônio, como a construção de sua sede social e do estádio Evandro Almeida, mas também contou com a perda de imóveis e uma enxurrada de inadimplência no seu quadro de sócios de uns anos para cá.
“O Remo já foi um clube forte na parte social. Além de participar de todas as competições sociais entre clubes, tinha algumas das festas mais disputadas da cidade. O Baile do Pierrô, organizado pela Eneida de Moraes, era uma das maiores festas de carnaval da cidade”, relembra o servidor público Claudio de Castro Coutinho, 53 anos, sócio proprietário do clube e azulino de berço. “Meu avô, Ludgardes, foi ponta-direita do primeiro time de futebol do Remo. Cresci muito próximo dele, então me tornar azulino foi algo natural”, lembra.
Apesar da tradição familiar, Claudio admite que tem estado afastado do convívio social com o clube há alguns anos. “Eventualmente vou à sede comprar ingresso para jogos, ou alguns itens na loja do clube, mas o clube atualmente oferece pouco ao seu associado”, reclama Claudio.
Claudio não é o único que pensa assim. Apesar de ter um número total de associados bastante expressivo, 22.500, os sócios remistas tem se afastado do clube e a inadimplência domina. Uma dinâmica que tem se estabelecido, e reforçado, desde o final dos anos 80. “O Remo é um clube, que montou um time de futebol. Com o correr dos anos, o time de futebol se sobressaiu ao clube e seguidas gestões com esse pensamento – valorizando o futebol em detrimento do clube – acabaram por deixar o lado social em situação de abandono. O sócio se afastou do clube, que vinha tendo pouco a oferecer em retribuição”, define o atual diretor comercial do Remo, Stefani Henrique.
Stefani é um dos novos diretores azulinos apresentados pelo presidente Zeca Pirão no mês de julho. Ele destaca o desejo mútuo de revitalizar o lado social. “O Remo tem sido vítima das dívidas contraídas, ao longo dos anos, pelo futebol. Precisamos tornar o clube viável e independente do futebol se quisermos ver o Remo crescer de forma permanente”, afirma o diretor, oriundo de uma associação de sócios do clube, a Assoremo.
Tem que oferecer um algo a mais
Na Avenida Nazaré se concentra o coração do Clube do Remo. Adquirido em 1938, o prédio, outrora chamado Palácio Azul, concentra a presidência do clube e uma boa parte de sua história. Esse prédio concentra ainda, basicamente, o que o Remo tem a oferecer aos seus sócios. O ginásio poliesportivo Serra Freire, o parque aquático azulino – composto de duas piscinas semi-olímpicas e uma infantil -, uma quadra descoberta de futsal e um salão para eventos com capacidade para até 500 pessoas. Fora essas construções, existe o Leão Sport Bar, o restaurante Sabor Centenário e a Remo Store, loja oficial de produtos do clube – todos terceirizados dentro da sede.
Embora nem todos os espaços funcionem atualmente – como o ginásio, que segue fechado para reformas – a sede social azulina é relativamente bem conservada. “Nos próximos dias, estamos programando uma limpeza geral na sede, removendo todos os entulhos”, afirma o diretor de sede do Remo, Guilherme Gianino. “Temos investido em algumas atrações para atrair os sócios à sede, como música ao vivo e uma cama elástica, que fica disponível para as crianças na piscina. Sabemos que não tem jeito, precisamos oferecer algo para o sócio retornar”, admite Gianino.
É difícil comparar a sede azulina com outros grandes clubes da cidade e mesmo com a sede da Tuna – cuja sede é ao mesmo tempo social e campestre, mas segundo os dirigentes azulinos, o plano é em breve crescer a oferta aos seus associados. “Estamos trabalhando para aumentar a oferta aos sócios. Além do ginásio, cuja reforma deve ser retomada esta semana, estamos trabalhando numa reforma da antiga academia do clube, que atualmente está abandonada. Também pretendemos construir, em frente ao ginásio, um campo de futebol society, o maior da região, e deixá-lo à disposição dos associados. Tudo para os próximos meses”, sinaliza Stefani.
Débitos são perdoados por R$ 30
Há um ditado que diz que se você tem um grande exército, mas não pode contar com ele quando precisa, então na prática você não tem exército algum. Se cada torcedor do Remo ganhasse um ingresso gratuitamente para os jogos do time no Parazão, o Baenão precisaria passar por uma ampliação, pois sua atual capacidade de 14 mil torcedores não daria conta. Desse número impressionante, no entanto, menos de 1% contribuem mensalmente para as finanças do clube.
“Não tem como pagar a manutenção da estrutura apenas com a verba dos associados. O apoio e contribuição dos abnegados ainda é decisivo para a manutenção da estrutura”, afirma o diretor social Guilherme Gianino. “O clube lançou recentemente um programa de anistia para os sócios inadimplentes. Se o sócio procurar o clube e pagar uma taxa de R$ 30, ele tem sua dívida perdoada e pode continuar contribuindo regularmente com a mensalidade normal”, comenta Gianino.
O diretor comercial Stefani Henrique afirma que esse retorno dos associados passa por várias estratégias. “Temos um plano de ocupação da sede azulina. Queremos que o salão do clube volte a sediar eventos e construir um calendário regular de atividades, como as serestas às sextas-feiras, que estão em negociação para retornar”, diz o diretor.
“Vamos apresentar um novo projeto de Sócio Torcedor, a partir de outubro, mas temos procurado valorizar quem já faz parte do programa para que ele não se torne inadimplente. Enquanto faltar calendário para o Remo no futebol, nós temos colocado algumas vantagens do sócio para o sócio-torcedor também”, como poder frequentar a sede social e participar das promoções do clube”, informa Stefani.
Do quadro de associados azulinos, 11 mil não pagam mensalidade e nem tem mais a obrigação de pagar. São os donos de títulos remidos, que compraram com investimento único o direito aos títulos em definitivo. Embora não sejam uma unanimidade, os atuais diretores tem uma visão positiva desse grupo. “A venda de títulos remidos foi importante para o clube, porque nos permitiu, no início dos anos 90, comprar o terreno em Benfica que se tornaria a nossa sede campestre. Infelizmente, por seguidas más gestões, esse patrimônio adquirido se perdeu. O que acredito é que precisamos parar com os erros de gestão para não vir a perder novamente”, diz Stefani Henrique.
Sede náutica se apoia em parcerias
A sede náutica do Remo, prédio histórico com 108 anos de idade, hoje vive da dedicação e cuidado de seus abnegados. “A realidade é que o clube há muito tempo se afastou da sede náutica. Nunca se interessou realmente por aqui e o resultado disso é essa situação que você vê”, afirma Issa Ayan, diretor náutico do Leão e um dos principais mantenedores do espaço.
Ayan aponta para o mezanino, no segundo andar do prédio, área originalmente construída para receber as festas e eventos sociais do clube, mas que hoje se encontra completamente abandonada e deteriorada. “O Remo se voltou para o futebol, que endivida o clube e nós acabamos penando por isso. Eu reclamo muito nas reuniões na sede”, diz o diretor. Ayan assumiu o departamento há 4 anos e hoje em dia divide a gestão da sede com o grande benemérito Hermes Tupinambá.
Uma profunda reforma tem tomado espaço no prédio, fruto de um acordo da direção com os donos de uma casa de espetáculos vizinha. “Eles investem na revitalização e modernização da sede, entram com uma cota de patrocínio e, como contrapartida, colocaremos o espaço do nosso salão de eventos à disposição deles e eles terão autorização para ampliar o terraço do seu empreendimento para a frente do nosso cais”, explica. Os banheiros da sede náutica foram revitalizados e o salão, embora não esteja ainda pronto, também aparenta feições muito boas e condizentes com a tradição do clube.
A garagem náutica apresenta uma aparência boa. Barcos, remos e demais equipamentos novos em folha dividem espaço com algumas embarcações históricas, algumas já aposentadas.
Diário do Pará, 11/08/2013