No caminho em busca do acesso à Série C, o Vilhena (RO) vem deixando marcas que confirmam a distância entre sonho e realidade. O clube do interior de Rondônia trilha um calvário que parece não ter fim. Dono de glórias recentes, como cinco títulos estaduais, participações seguidas em Copa Verde e Copa do Brasil, acostumado a ter uma torcida rondoniense apaixonada, o Lobo do Cerrado respira a conta-gotas na Série D do Campeonato Brasileiro.
Projetado como o ano das conquistas, 2015 revelou-se o “inferno astral”. Sem patrocínio, salários atrasaram, jogadores largaram o time, e quem resolveu seguir no clube, por amor ao escudo, encontra-se no limite. Para piorar, na última segunda-feira (24/08), o presidente José Carlos Dalanhol mandou fechar as portas e cancelou o treino da tarde após o elenco ter feito atividade pela manhã à revelia do dirigente.
Em decisão surpreendente, mesmo com salários atrasados (3 meses em média), os atletas revelaram desejo de continuar até o fim da competição. Tanto a Federação Rondoniense como a CBF, até o momento, não receberam qualquer comunicado da direção do Vilhena (RO).
“Está difícil. Fomos surpreendidos hoje (segunda-feira). Nosso presidente resolveu fechar o clube. Não sei o que passou pela cabeça dele. De manhã já não era para a equipe treinar. Tínhamos uniforme e conseguimos treinar contra a vontade dele. Ele não queria que treinássemos. Estou tentando de todas as maneiras, pela tradição do Vilhena (RO), pelo amor que tenho aqui pela cidade, estava tentando fazer com que sobrevivesse e porque temos reais chances de classificação ainda”, disse o técnico Marcos Birigui.
“Estava treinando, mesmo com todas as dificuldades. Todo mundo sabe, já estava começando a faltar coisas em termos de alimentação. Com todas as dificuldades, estávamos fazendo um campeonato bom, não passamos vergonha em nenhum jogo. Todos os jogos jogamos de igual para igual, mesmo com 12, 13 jogadores e alguns mesmo sem reserva”, continuou.
“Viemos treinar de tarde e encontramos o vestiário fechado. Levaram todo o material, as bolas, tudo. Fomos impedidos de treinar. Então, a gente está dando esta entrevista, abismado. Porque já vi o funcionário fazer greve, agora o patrão fazer greve? Acho que é a primeira vez que acontece na minha vida, em 43 anos de futebol”, afirmou Birigui, no estádio Portal da Amazônia.
Além de fechar as portas, o Vilhena (RO) ainda perdeu o diretor de futebol nesta segunda-feira, 24/08. José Natal Pimenta Jacob enviou ofício ao presidente do clube informando o afastamento definitivo da função. No documento, não esclarece os motivos e pede que seja feita a comunicação aos órgãos competentes. Procurado, o presidente Dalanhol não quis se pronunciar a respeito do assunto, mas disse que mandou fechar as portas e que os jogadores estão insistindo em treinar.
“Mandei fechar. Vão acabar todos os (times) profissionais de Rondônia por causa da imprensa. Mandei fechar. Eles estão teimando, mandei-os parar de treinar. Amanhã fecho de novo”, disse.
Antes de anunciar o fechamento do clube, José Carlos Dalanhol, o “Gaúcho do Milho”, como é conhecido, começou a enfrentar outros problemas. Entre eles, a saída de 12 jogadores, técnico e auxiliar que acionaram a Justiça do Trabalho para receber salários atrasados, entre outros direitos. O montante gira em torno de R$ 500 mil. Os jogadores ainda denunciaram maus-tratos.
O caso, no entanto, não é isolado. Há uma semana, duas ex-cozinheiras do clube registraram boletim de ocorrência contra o presidente, que por mensagem telefônica ameaçou jogar água quente nas funcionárias.
Segundo a tabela do Brasileirão da Série D, o Vilhena (RO) enfrentaria no próximo domingo o Náutico (RR), em Roraima. Em seguida, receberia o Nacional (AM) e encerraria a primeira fase da competição contra o Remo, em Belém. Com 5 pontos e na 3ª colocação, o time ainda sonha com a classificação, mas além dos problemas com a falta de jogadores para compor o plantel, agora o time não pode treinar.
Segundo o técnico Birigui, o anúncio do fechamento do clube foi feito por telefone e uma reunião ocorreria com os atletas que decidiram permanecer.
“Estamos prontos para defender o Vilhena (RO), mesmo sem salário, para fazer esses 3 jogos, pelo menos para terminar com dignidade, não abandonar o Campeonato Brasileiro. Depois tem os problemas que vão acarretar essa desistência: multas, vai ficar fora de competição nacional por muito tempo e a torcida do Vilhena (RO) é muito apaixonada. Vivi momentos maravilhosos aqui dentro. Não queria que terminasse dessa maneira, vou brigar, vou lutar. Vou sair agora no comércio, com o chapéu na mão, pedindo para ver se alguém pode nos ajudar”, disse Birigui.
O time está atrás do Rio Branco (AC), que tem 11 pontos, mas Birigui acredita ser possível ganhar do lanterna Náutico (RR), mesmo fora de casa, e do Nacional (AM) no Portal da Amazônia, em Rondônia.
“Nós estamos aqui prontos, os jogadores estão prontos para trabalhar. Para ele, o time fechou e desistiu da Série D, mas para os jogadores não, nem para a comissão técnica. Estamos tentando ainda fazer com que o Vilhena (RO) continue, mas nós precisamos de respaldo. Amanhã (quarta-feira, 26/08) à tarde está marcado o treinamento. Nós pelo menos vamos manter a nossa agenda. Não podem dizer que essa culpa será dos jogadores e da comissão. Estamos prontos aqui para trabalhar, é só ter uma ajuda. Tomara que essa ajuda venha, porque está ficando até meio ruim”, desabafou.
Globo Esporte.com, 25/08/2015