Fred Gomes, que por quase 2 anos exerceu a função de executivo de futebol do Remo, contou boas histórias dos bastidores do clube e explicou o motivo pelo qual teve que acionar a Justiça Trabalhista para tentar receber os salários atrasados e demais direitos que, segundo ele, não foram quitados nas administrações de Pedro Minowa, Manoel Ribeiro e André Cavalcante.
De acordo com Gomes, ao final de 2015, quando foi chamado para renovar o vínculo, o clube já acumulava débitos com ele. O acerto para sua permanência só foi possível após a negociação dos valores atrasados, mas o executivo afirma que nunca recebeu nenhum dos valores aferidos. Não ter conseguido a classificação para a 2ª fase da Série C deste ano foi o estopim para sua saída.
“Desde 2015, quando fui chamado para renovar, já renovei com débito dentro, mas fiquei no clube para tentar viabilizar a continuidade do trabalho. Fizemos um acordo de 2015 e não pagaram nada. Este ano, como não fomos para a 2ª fase, pedi ao André (Cavalcante) para sair. Foram 2 anos difíceis e de desgaste, que me envolvi, por tabela, no processo político”, disse.
O dirigente afirma que a dívida total do Remo com o elenco após a eliminação da Série C girava em torno de R$ 2,8 milhões, o que foi reduzido para aproximadamente R$ 980 mil através de sua intermediação junto aos jogadores, mesmo sem a diretoria disponibilizar nenhum centavo para colocar os acordos em prática. Nesse mesmo período, Fred também negociou os valores de sua própria rescisão.
“A dívida era de R$ 2,8 milhões, mais ou menos, e consegui reduzir para R$ 980 mil. Terminei minha planilha (das rescisões) com os acordos, mas teve quem não fizesse também. O atleta Allan Dias não tinha feito o acordo dele, por exemplo”, contou.
“Também estava nesse meio. Abri mão dos meus direitos e outras coisas, mas não recebi. O último salário que caiu na minha conta foi de junho deste ano. Tinha ainda 3 meses do ano passado, 3 deste ano e mais a premiação pelo acesso. Essa é a explicação pela qual tive que buscar meus direitos na Justiça”, revelou.
A situação dos salários atrasados dos jogadores também é apontada por Fred Gomes como um dos fatores preponderantes para o insucesso na Série C. Porém, no geral, o executivo afirma que o Remo deu um salto importante, já que conseguiu ascender mesmo com uma série de questões internas negativas envolvendo os próprios diretores e abnegados.
“Se você fizer uma análise completa da situação, vai ver que o insucesso acabou se tornando sucesso, porque um clube que passou 8 anos no ostracismo e, no final, conseguiu buscar uma Série C e um equilíbrio, conseguiu um destaque a nível nacional, é para ser comemorado”, acredita.
“Em 2 anos, tive 4 presidentes. Participamos de 4 modelos de gestão diferentes. Cheguei a ser obrigado a tirar dinheiro do meu bolso para não expor a instituição. Tentamos blindar de todas as formas, mas vi muita gente no Remo querendo pensar em si e não na instituição. O clube acaba ficando para trás”, denunciou Gomes.
“A sorte está na torcida que não deixou o time figurar na zona de rebaixamento. A equipe até oscilava, mas não correu riscos esse ano. Tudo isso era reflexo da gestão. A questão dos salários influenciou, sim. Quando você se compromete e não cumpre, você tem desgaste. Em 2015, quando chegamos aos 3 meses, mudamos o foco: o que entrar no futebol será dividido. Quando você começa a achar que só vai receber quando a bola entrar, aí complica”, pontua.
Confira outros pontos da entrevista:
[one_half last=”no”]Fred atualmente
Desde que sai do Remo, tirei uns 30 dias de férias. Apareceram algumas coisas, mas não fechei com ninguém. Foram dois anos de trabalho e muito suor, e respeito ao torcedor.[/one_half][one_half last=”yes”]Justiça do Trabalho
Procurei o André (Cavalcante), que estava ciente de tudo, mas não tive contato desde então. O atual vice-presidente (Ricardo Ribeiro) também sabe, ele é meu amigo particular. Deixei Belém no dia 04/10 e ele recebeu minha planilha de rescisões.[/one_half]
Função de “executivo” no Remo
Muita gente nos rotula e diz que só contratamos e demitimos. Ledo engano. Cada contratação tem que ser avalizada por sei lá quantas pessoas. Não sou o dono da razão. Coloquei nome de “A” ou “B” e fui voto vencido. Difícil é reconhecer. Começamos a temporada sem presidente. Não sabíamos quanto poderíamos gastar e sabíamos que 30% das rendas estava bloqueada. Era esse o cenário. Um executivo precisa saber administrar o vestiário, trazer benefícios de fora para dentro, lidar com a comissão técnica, jogadores e diretoria, ter conhecimento, liderar e entender o processo.
[one_half last=”no”]Exemplos no futebol
A parte política não pode influenciar. Você tem exemplos da Chapecoense (SC), do Sampaio Correa (MA), quando teve 2 acessos consecutivos e até do rival (Paysandu), que não sei por que também não pode servir de exemplo, mas deveria. O Paysandu é uma realidade hoje.[/one_half][one_half last=”yes”]Perfil financeiro
Quando vai montar um time, a gente vê o perfil financeiro, técnico e disciplinar; depois, se o jogador se encaixa nisso tudo. Tudo isso com a avaliação do treinador. A gente buscava e, quando acertávamos, éramos todos certos, mas o erro também era coletivo.[/one_half]
Parceria com outros clubes
Um caso emblemático foi quando assumimos o Remo, em 2015. Entre Flamengo (RJ) e Remo estava tudo certo para uma parceria, mas os atletas não queriam jogar no Remo. Fomos ao Palmeiras (SP) e trouxemos o Matheus Müller. Pagávamos um valor simbólico, 25% do salário dele. Queríamos permanecer com ele, mas o Palmeiras (SP) achou melhor ele ir para um time paulista. Depois descobrimos que aquele “valor simbólico” não estava sendo cumprido pelo Remo e vieram me cobrar. Quando começou esse ano, fui para São Paulo. Como você consegue apagar essa situação e novamente trazer o cara para jogar aqui? Tentamos trazer atletas do Internacional (RS). Quando o presidente (André Cavalcante) fez uma visita ao presidente Eduardo Bandeira (Flamengo-RJ), ele e o Rodrigo Caetano (gerente de futebol) nos colocaram à disposição o Recife (volante) e o Igor (atacante), mas eles não quiseram vir. Qualquer atleta que o Flamengo (RJ) não fosse utilizar, a gente poderia tentar trazer.
[two_third last=”no”]Pagamento de “luvas” e caso “Eduardo Ramos”
Acabamos! “Luva” no Remo, só se fosse de goleiro. Quando cheguei, nem uma Série a gente tinha, mas o Eduardo tinha 2 anos de contrato com R$ 50 mil de salário. Depois, o pai dele disse que eu estava negociando ele com o Ceará (CE), mas não é verdade. O presidente do Ceará (CE) me ligou perguntando a situação do Eduardo e disse que ele era o jogador mais caro. Ele me falou que se a multa fosse pagável, ele iria pagar. Não houve um oferecimento do Fred. Pouco depois, Eduardo me procurou junto com o Cacaio e disse que não iria mais treinar porque tinha acertado tudo com o Ceará (CE). Foi quando eles (Ceará-CE) tomaram conhecimento da multa de R$ 2 milhões e a diretoria do Remo prorrogou o contrato dele.[/two_third][one_third last=”yes”]Extracampo do Eduardo Ramos
O atleta nunca deu problema para nós nos 2 anos. Se ele tinha alguma coisa fora das quatro linhas, nunca deu margem no dia a dia para receber punição. Ele sempre assumiu sua responsabilidade, nunca se escondia. Eduardo não tinha o que ser questionado. Nunca se opôs a nada, sempre participou de tudo. Até no jogo contra o ABC (RN), que ele não tinha condições de jogo, ele iniciou a partida.[/one_third]
Técnicos procurados
Tentamos muitos treinadores, mais de 15 treinadores. Não quiseram vir pela situação financeira, como o Waldemar (Lemos) também vivenciou no final. Tentamos o Claudinei Oliveira, Ricardinho, Dado Cavalcanti, Sérgio Guedes, Toninho Cecílio, Ricardo Drubscky, que ficou bem perto, mas optamos pelo Waldemar. Itamar Schulle também. Quando o Leston Júnior saiu, eles (diretoria) tinham 3 nomes: PC Gusmão, Estevam Soares e Marcelo Veiga. Optaram pelo Marcelo pela história não terminada que ele tinha tido no Remo. Além disso, era um treinador que conhecia a Série D e era campeão.
Globo Esporte.com, 26/12/2016