Mudanças são sempre muito complicadas na vida de uma pessoa. Com jogador de futebol não é diferente. Há sempre atletas promissores, que nas categorias de base são verdadeiros “craques”, mas na hora que sobem para o time profissional, sofrem com a adaptação e acabam não tendo o desempenho que se esperava deles.
No Clube do Remo, alguns jogadores já passaram por situação semelhante. Há outros, porém, que acabaram não tendo sequer oportunidades, que simplesmente foram “queimados” e perderam espaço. Nesta temporada, atletas que vinham sendo renegados por diversos treinadores ganharam a tão sonhada oportunidade de mostrar o seu valor.
Um destes jogadores é o polivalente Tsunami. Durante os cerca de 4 anos que está no time profissional, o atleta tem verdadeiramente recebido chances pela 1ª vez. O jogador comenta que quando um garoto sai da base é muito difícil.
“Não temos o mesmo nível de trabalho. É bem diferente. Quando saí, o campo não era tão bom. A estrutura não era boa. Hoje já deve ter melhorado muito”, contou o azulino, que chegou a treinar em times referências nas categorias de base, como Cruzeiro (MG) e Sport (PE).
Após a derrota para o Santos (AP), alguns garotos da base foram bastante questionados, principalmente o atacante Gabriel Lima, recém-promovido, por ter perdido muitos gols.
“Isso é normal. Pode acontecer com qualquer um, mais novo ou com mais experiência”, afirmou Tsunami, ressaltando que os mais experientes sempre aconselham. “Zé Antônio, Flamel e Henrique sempre conversam com a gente. Eles são mais rodados. Temos de prestar atenção, porque eles sabem o que estão dizendo”, completou.
O jogador destaca que nesta temporada, com o treinador Josué Teixeira, todos os garotos estão tendo oportunidade de jogar no time titular. Por isso, é importante que cada um deles aproveite a chance.
“Não podemos entrar com moleza. Entro dando tudo de mim. Josué sabe ganhar o jogador. Ele vê quem tem qualidade e dá a oportunidade para todo mundo, independentemente da idade”, disse.
Alguns fatores são importantes para a adaptações de atletas recém-promovidos das categorias de base ao time profissional. Entre elas, está a relação com os jogadores mais rodados. O zagueiro Henrique, capitão do time e um dos jogadores mais experientes do elenco, conta que imprensa e torcida sempre cobram oportunidade aos garotos e que eles estão tendo.
“Eles têm a confiança do treinador Josué Teixeira. Já vêm treinando conosco desde dezembro. O que pudermos fazer para ajudar, vamos fazer”, destacou.
O goleiro Vinícius conta que também ajuda bastante os atletas da base, sempre com conversas e explicando as situações, como as que ocorreram na partida contra o Santos (AP). O arqueiro diz que é importante fazer com que os jovens atletas não percam o foco.
“É normal dentro de uma partida você cometer falhas. A gente sempre procura dar força, principalmente para o Gabriel Lima. É um garoto que está focado, que vem treinando muito bem, com personalidade, não sentiu e isso é muito importante”, ressalta o arqueiro.
O treinador Josué Teixeira chegou com o discurso semelhante ao de muitos outros técnicos que vieram ao Clube do Remo, de que daria chance aos meninos da base. A grande diferença é que o técnico tem cumprido a promessa. Só que nesta fase de transição dos garotos, é importante que haja diálogo e também preocupação para que toda uma geração de atletas não seja perdida, em caso de um insucesso.
Se quando o Remo vinha de uma série invicta a pressão já era grande, após a eliminação precoce na Copa Verde, as cobranças sobre os meninos só fizeram aumentar. Entretanto, Josué acredita que isso é normal.
“Não tem como fugir. Você tem de fazer o trabalho interno com o jogador, passar a confiança”, afirmou. “No dia mesmo do jogo, conversei com o Gabriel. Ele é um jogador importante, lutou, brigou, mas perdeu os gols. Poderia ser herói, entrar para a história com 6 gols marcados. Hoje ele valeria R$ 5 milhões, por causa dos gols marcados. É um bom jogador”, disse o técnico.
Josué comentou também sobre a cobrança em cima do zagueiro Igor João. “Conversei também com ele. É mais experiente, já viveu outros momentos e é criticado demais. Foi infantilmente expulso e prejudicou a todos. A gente tem sempre que falar a verdade para o jogador”, destacou.
O comandante acredita ainda que, pelo trabalho que vem sendo feito, este grupo de jogadores não será “queimado”, pois os garotos estão jogando bem.
“Você tem de ter tranquilidade para os meninos não serem ‘queimados’, isentando eles de culpa. Você tem jogadores experientes e eles têm de chamar a responsabilidade e assumir as suas decepções e não deixar para os garotos”, afirmou Josué.
A base do Clube do Remo, mesmo com todas as dificuldades, tem revelado alguns bons valores para a equipe principal. Porém, os jogadores ainda sofrem um pouco com a estrutura oferecida, para que cheguem aos profissionais da melhor forma possível. Como se observa, nesta temporada, os garotos do Leão têm sido bastante utilizados e é preciso cuidar para que possam dar retorno ao clube.
O diretor da base, Paulinho Araújo, conta que há um trabalho com diversos profissionais para que eles atendam aos garotos da base. “Temos o acompanhamento psicológico, para orientar essa garotada”, afirmou o dirigente, apesar de ver que há outras situações mais complicadas.
“O que é preciso entender, é que não temos o investimento necessário para que ela seja de ponta, como no eixo Sul-Sudeste. Mesmo assim, dentro das possibilidades, fazemos o máximo. No caso do Gabriel (Lima), conversei com ele, disse para levantar a cabeça. É um bom garoto, bom jogador. Para mim, naquele jogo, ele foi o melhor em campo e ainda vai dar muito fruto para o Remo”, destaca.
Com todos os acontecimentos, a base voltou a ser questionada. Paulinho destaca que nenhuma categoria de base deixa um jogador de futebol pronto. “Ele ainda precisa criar aquele lastro, treinar no profissional, fazer algumas partidas para pegar experiência. É um outro ambiente. Se ele não render, está fora. Nenhum sai pronto”, explicou.
O dirigente conta ainda que no futebol paraense há uma característica que atrapalha o crescimento de atletas da base. “Ninguém tem paciência com jogador local. Santo de casa não faz milagre. O jogador daqui, às vezes, é muito melhor que o de fora, mas não é aproveitado. É só lembrar o ano passado. Tinham uns jogadores ruins e a própria torcida tinha mais paciência, mas se fosse alguém da base, tinha de chegar e resolver”, analisou.
Diário do Pará, 09/04/2017